Em 2006, entrei no curso de Letras na Universidade Federal de Rondônia e tive, o que pra mim, foi uma das, senão a mais importante disciplina que poderia ter em uma faculdade: Linguística Geral. Pra quem não sabe, a linguística é o estudo da linguagem verbal humana, que explica entre outros assuntos, os fenômenos da língua, ao invés de tentar impor regras de uso, como as gramáticas fazem.
Muita gente é contra os conceitos da linguística por achar que essa aceita tudo que é dito e escrito, e não é isso. Este estudo prega sim, que exista uma norma culta, pois existem momentos em que ela é essencial, mas prega também que ao invés de julgarmos uma pessoa que não a use, possamos tentar entender o por quê disso. Ao analisarmos a parte histórica, regional, cultural ou social, entendemos que muito do que se fala tem uma explicação. Como aceitar a imposição de uma única regra, se pensarmos que o Brasil possui 27 estados, divididos em 5 regiões e em torno de 193 milhões de brasileiros. Como exigir que essa multidão se comunique de uma única forma?
Essa disciplina me deixou mais crítica em relação ao que chamamos de certo e errado. Assisti no último sábado, o programa 'Caldeirão do Huck', que traz a disputa do 'Soletrando', desde 2007. Lembro que no primeiro espisódio o apresentador, Luciano Huck, fez um vídeo em que mostrava a grandeza do nosso país e dizia que a única característica que temos em comum seria o fato de todos falarmos a mesma língua! Para uma adepta da linguística, um simples absurdo.
Marcos Bagno, é um autor mestre em Linguística e que escreveu muitos livros a respeito do tema. No clássico 'Português ou Brasileiro', ele fala sobre a dificuldade dos professores de ensinar a língua em pleno século XXI:
Ensinar português significa inculcar um conjunto de prescrições sintáticas consideradas "corretas", impor uma série de pronúncias artificiais que não correspondem a nenhuma variedade linguística real, cobrar a memorização mecânica e estéril de uma nomeclatura falha e incoerente, junto com definições contraditórias e incompletas. (...) Ensinar o brasileiro é ter uma visão mais sintonizada com o pensamento científico contemporâneo.É admitir que a Gramática Tradicional, depois de 2.300 anos de soberania, é uma página virada da História, representa uma etapa - já concluída- da evolução do conhecimento humano sobre o fenômeno da linguagem. Que foi uma contribuição importante, mas que é preciso ir além dela, avançar, criar um conhecimento novo. (...)
Na novela sociolinguística, 'A língua de Eulália', Bagno fala sobre o papel da escola:
(...) a própria escola não reconhece que a norma padrão culta é apenas uma das muitas variedades possíveis no uso do português e rejeita de forma intolerante qualquer manifestação linguística diferente, tratando muitas vezes os alunos como "deficientes linguísticos". Falar diferente não é falar errado e o que pode parecer erro no português não-padrão tem uma explicação lógica, científica (linguística, histórica, sociológica, psicológica).
Aceitar a diversidade que possuímos é o primeiro passo para que esse 'preconceito linguístico' pare de existir.
Diante de tantas explicações, os linguístas ainda defendem que a maneira mais eficaz de se ensinar o aprendizado da escrita coerente, dentro das normas gramaticais, seria o incentivo a leitura e a escrita. E existem projetos no Brasil para que haja esse incentivo, mas essa já é uma outra história...
Termino esse texto com a poesia 'Ai se sêsse', de Zé da Luz, apresentada pelo grupo Cordel do fogo encantado. Espero que gostem e que entendam que o importante é nos comunicarmos!
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